quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

A Tempestade do Destino

Por vezes o destino é como uma pequena tempestade de areia que não pára de mudar de direção. Você muda de rumo, mas a tempestade de areia vai atrás de você. Você volta a mudar de direção, mas a tempestade persegue, seguindo no seu encalço. Isto acontece uma vez e outra e outra, como uma espécie de dança maldita com a morte ao amanhecer. Por quê? Porque esta tempestade não é uma coisa que tenha surgido do nada, sem nada que ver contigo. Esta tempestade é você. Algo que está dentro de você. Por isso, só lhe resta deixar levar, mergulhar na tempestade, fechando os olhos e tapando os ouvidos para não deixar entrar a areia e, passo a passo, atravessá-la de uma ponta a outra. Aqui não há lugar para o sol nem para a lua; a orientação e a noção de tempo são coisas que não fazem sentido. Existe apenas areia branca e fina, como ossos pulverizados, a rodopiar em direção ao céu. É uma tempestade de areia assim que deve imaginar.

(...) E não há maneira de escapar à violência da tempestade, a essa tempestade metafísica, simbólica. Não se iluda: por mais metafísica e simbólica que seja, rasgar-lhe-á a carne como mil navalhas de barba. O sangue de muita gente correrá, e o seu juntamente com ele. Um sangue vermelho, quente. Ficarás com as mãos cheias de sangue, do seu sangue e do sangue dos outros.
E quando a tempestade tiver passado, mal se lembrará de ter conseguido atravessá-la, de ter conseguido sobreviver. Nem sequer terá a certeza de a tormenta ter realmente chegado ao fim. Mas uma coisa é certa. Quando saíres da tempestade já não será a mesma pessoa. Só assim as tempestades fazem sentido.

Haruki Murakami, em 'Kafka à Beira-Mar'

Nenhum comentário:

Postar um comentário